No dia 28/01 (sexta-feira) um grupo de 39 pessoas do AIACOM, em adesão à campanha “suba a serra brincando” visitou 03 abrigos em Teresópolis. Seguindo os rumos da mobilização da campanha, tinha-se a expectativa de articular/organizar atividades brincantes com crianças e adolescentes, na perspectiva de humanizar a trágica situação em que se encontram. Diante a gravidade da situação, tecemos alguns combinados que consideramos ser importantes nesse momento. Combinamos de oferecer nosso afeto e cuidado, de provocar sorrisos e alegrias, de manter o bom humor (mesmo diante do inusitado e adverso), enfim, de vivenciar na companhia das crianças e jovens momentos de descontração e contentamento. Em contraponto, combinamos também que tentaríamos manter um comportamento acolhedor, porém, cuidadoso e pouco invasivo. Evitamos saturar as pessoas com perguntas acerca de seus dramas e tragédias, afinal não se trata de um espetáculo. Oferecer a escuta e atenção para quem, espontaneamente, sinalizasse esse desejo. Combinamos que estaríamos atentos para não estressar/incomodar as pessoas que estão na coordenação ou as que atuam como voluntários diariamente, mesmo diante as situações que pudessem nos parecer equivocada ou injusta.
1. Abrigo - Projeto Vida Nova
Crianças e jovens em idades variadas e mistas, que de início, se mostravam dispersar e desconfiadas. Como estratégia de aproximação as educadoras convidaram para uma roda e começaram a encher balões. Pronto: o suficiente para agregar todas as idades e energias. Rapidamente a energia e o colorido dos balões tomaram conta da cena, fazendo fluir muitas brincadeiras divertidas. Nesse abrigo a marca maior foi o contato físico. As meninas (eram em maior número) sentavam no colo, abraçavam e eram abraçadas enquanto brincavam com miçangas, bolas, giz de cera e dobraduras, completamente entregues e absortas às atividades, recostando a cabeça no colo ou no ombro das educadoras, como se as conhecessem há muito tempo. Lá conseguimos realizar a fluoretação dentária em todo mundo (adultos e crianças). Os meninos e rapazes se envolveram muito rapidamente nas atividades de pipa e pára-quedas. Quando partíamos uma menina (talvez 07/08 anos) correu atrás do carro para saber se a gente voltaria e outra criança bem pequena seguiu conosco e sua mãe até o posto de saúde. Sentia muitas dores no ouvido e quase não participou de nada.
2. Abrigo - Igreja Metodista Central
A coordenação responsável foi bastante receptiva e acolhedora com a nossa visita. Disponibilizando o espaço, porém diziam ter dificuldades em agregar as crianças, alegando que elas eram dispersas e agitadas. Diante o inusitado, o grupo começou a desenvolver atividades individualmente com as crianças. Alguns brincantes diziam / pensavam: “Seriam crianças de rua?” meninos de rua, de lua, aluados, bolados, numerados, calados, paridos, partidos, desterritorializados, afobados, assustados, inquietos e até desafiadores, mas que não resistem a uma boa história. Nesse abrigo, a estratégia que surtiu efeito foi a contação de Histórias. Começaram a contar histórias para um grupo pequeno e logo em seguida foram aproximando outras crianças. Para um mesmo menino foram contadas 08 histórias, até que ele pudesse revelar (o que talvez pudesse parecer óbvio, mas não aos olhos de quem escolhe educar como profissão), não sabia ler! Podemos ler as imagens, sabia? Disse-lhes a brincante. Por fim foram realizadas brincadeiras que envolviam a atenção de todo o grupo, inclusive a do motorista, que passou boa parte de tempo jogando bola com os meninos. A coordenação demonstrou ares de espanto, dizendo que elas nem imaginavam que “aquelas crianças” pudessem fazer algo no coletivo de forma tão coordenada.
3. Galpão de Bebidas Comari
De todos os espaços visitados, esse parece ter sido o mais difícil. A coordenação não oferece boa recepção a quem chega visitando. Lá os voluntários (funcionários da prefeitura?) demonstram, para além da animosidade, uma certa irritação com a iniciativa de “bagunçar” o espaço, humanizando-o com brincadeiras e afetos. Falando em espaço... cabe externar que neste abrigo (detentor de uma cartografia assombrosa) as pessoas são referenciadas pelos números que marcam e dispõem seus colchões/cama. Como não tivemos muita colaboração na organização e no convite feito às crianças, essas utilizaram como estratégia para as brincadeiras a musicalização. Ligamos o aparelho de som (que havíamos levado) e a partir daí, fomos propondo as atividades. Alguns meninos (que eram em predominância) eram muito gaiatos e tentavam o tempo inteiro desestabilizar o desestabilizado (Isto é: um abrigo enorme com pessoas e camas espalhadas para todos os lados e uma enorme confluência de desejos atravessados – educadores, crianças, adultos, coordenadores, voluntários). Por fim, a química rolou, permeada por desafios, provocações e muitos sorrisos.
Cleidy Nicodemos